Na quitanda havia Mandiopan

Alberto desceu do carro.
Confuso pelo calor e por estar perdido mesmo. Segurava na mão um pedaço de papel desenhado com o mapa que deveria levá-lo ao sítio onde o casamento de um amigo estava por acontecer. Mas, em algumas das curvas, perdeu-se. Já estava há uma boa meia hora andando com o carro sem haver nenhum sinal de sítio ou civilização, apenas a estrada de terra e o mato ao redor, até que avistou uma pequena venda, quitanda, como costumava chamar.
- Boa tarde. - disse para o homem atrás do balcão. Era gordo, alto e usava um bigode que lhe escondia os lábios. A camiseta deveria ser branca, estava com pontos de diferentes cores. Cada ponto uma sujeira diferente.
- Boa.- respondeu o homem, voz seca.
- Por acaso o senhor sabe como chego no sítio Alavares?
O homem, que estava passando pano no balcão, parou, olhou para o teto e coçou o queixo:
- Alavares... sei não senhor... mas digo que o que tem de casa mais perto daqui num raio de uns 10km é só a minha casa, aqui atrás da venda.
Desconsolado, Alberto já previa perder o casamento do amigo e acabar voltando para casa. Pensou que tinha sido bom a esposa não ter ido junto, senão já estaria ouvindo algumas que não estava disposto a ouvir. Pegou o celular e olhou mais uma vez, na vã tentativa de encontrá-lo com sinal. Não havia. O sinal desaparecera desde que embrenhou pela estrada de terra adentro, isso uns 30 km atrás.
O desconsolo virou conformidade e, conformado, ele já pensava o que diria ao amigo: "Sim, perdi seu casamento, não sei porque teve a estúpida idéia de se casar no meio do meio do mato!" Alberto agradeceu o homem e virou-se em direção à porta, olhou para as poucas prateiras em volta e não acreditou no que viu: uma única caixa de Mandiopan. Lembrou-se de quando garoto como gostava daquilo, chegou até a apanhar em casa da mãe por dispersar a janta depois de comer tanto Mandiopan. Era um viciado, sem dúvida. Sofreu muito quando o produto saiu de circulação e não acreditou que aquela caixinha estava ali à sua frente.
Pegou-a, analisou-a e voltou ao balcão?
- O senhor tem mais disso?
- Não, esse é o último. A nova remessa chega daqui 2 semanas.
- Mas eu pensei que não vendessem mais isso.
- Acho que pararam de fazer aqui no Brasil, esses eu compro do Paraguai. É mais barato que comprar esses outros salgadinhos.
Alberto sorriu, perguntou o preço e pagou. Antes de deixar a quitanda ainda disse ao homem:
- Acho que nos encontraremos novamente...em umas 2 semanas. Pode reservar umas caixas pra mim?
O vendedor apenas acenou com o pano na mão.

Enquanto fazia o trajeto de volta, Alberto olhava para a caixinha e pensou, de repente: "Como aquele homem sobrevive com uma quitanda no meio do nada, sendo que nem casa por perto tem?"
A única resposta que poderia se dar era: por acaso, nada acontece.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Memento Mori

O desmatamento e a coriza

Ele não