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Mostrando postagens de dezembro, 2007

Um cartão de Natal

Não é exagero dizer que há horas ele estava ali, sentado na cadeira desconfortável de madeira, com a ponta da caneta pingando tinta azul no branco cartonado do papel. Coçava a têmpora num tique nervoso, como se as pontas dos dedos fossem capazes de fisgar a idéia de dentro de seu lago de imaginação. O lago estava seco. Pensar nisso o fez relembrar dos dias de que caminhava muito cedo, pés no chão, com um balde de alumínio numa mão e, na outra, a mão pequena e calosa do irmão mais novo, percorriam quilômetros até um açude que ainda não tinha sido devorado pelo monstro Sol e sua magia negra de fazer desaparecer a água. Chegavam no açude e enchiam o balde com a água barrenta que os animais deixavam. No caminho de volta, cruzavam com uma infinidade de carcaças e ossadas de bois, vacas, bodes. Do sertão só sabe quem lá viveu. Ele sabia e não queria mais saber. Uma buzina estridente na rua o despertou de sua seca viagem, voltou a si. O papel branco marcado por uma infinidade de pequenos p

A noite escura

A noite escura é vasta como sua escuridão. Estar dentro da noite escura é estar dentro de si, é ouvir como se o silêncio fosse algo a ser ouvido, por isso, calar ou falar, não importa. A noite escura nos brinda com a possibilidade de alternativas e todas são corretas. Permanecer com os olhos cerrados, deixando as pálpebras à mostra, ou abrir bem os olhos, deixando as pupilas se dilatarem ao máximo não fará diferença: não se pode ver a pele fina, sensível da pálpebra, não há fio de luz que leve algum objeto ao fundo do cérebro. Nada será visto de qualquer maneira. A não ser os desenhos que se formam do lado de dentro do olho e que, por vezes, parece saltar para alcançar a escuridão à frente, dançando lentamente e com sofreguidão, pequenos girinos acinzentados que tomam a noite escura para si, nadam livres pelo denso do que não se vê. Na noite escura, as esquinas são avenidas e as certezas deixam de ser. Na noite escura não há nada que comprove a vida a não ser o temor de não mais viv

Considerações sobre o futuro ano velho

Este ano está a ponto de se transformar naquele ano, como todo presente tem o irrefutável destino de se tornar passado, lembrança. Vai pro arquivo do arcabouço sustentado pelo pescoço e será revisitado algumas vezes, a fim de dar exemplo a uma conversa ou não errar por um mesmo motivo. 2007 foi um ano atípico para mim, atípico porque tive que reaprender coisas que eu pensei que não precisaria mais aprender. Tive que reaprender a usar meu corpo, tive que readequar meu limites... nunca me esquecerei do dia em que pude andar de novo. Sofridos 10 passos que me fizeram suar, chorar e sorrir. Suados 10 passos, lá em Fevereiro, que me ajudaram a andar muito mais no decorrer do ano. Conheci pessoas maravilhosas, entre elas eu mesmo. Como um xamã que usa de peyote para entrar em contato com o plano astral e curar os males que lhe chegam, eu - sem uso de peyote - também entrei em contato comigo, pra perceber os males que eu mesmo me implantava, as sabotagens que eu fiz para com minha felicida