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Mostrando postagens de setembro, 2007

O desmatamento e a coriza

Na minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá, de dia faz um calor danado e, à noite, sabe-lá o que vai dar. Cheguei à conclusão que o desmatamento é o ópio do clima terrestre. Porque cada vez mais devastado, cada vez mais pirado fica o clima, as estações, tudo que envolve a Natureza. Pobre Mãe-Natureza, está tão chapadona com a fumaça expelida pelas chaminés de fábricas, escapamentos de automóveis e afins que sequer consegue fazer suas tarefas mais básicas, como impor ao verão o calor e ao inverno o frio. Aqui, na parte de baixo do Hemisfério é Primavera, mas, na prática, isso é mentira descarada. Primavera coisa alguma, a estação agora é mutante, de acordo com os caprichos das frentes frias, quentes, mornas... Não pode-se mais dizer que uma estação é uma estação, ela é todas, depende do dia. Hoje, por exemplo, não é Primavera e sim Primaverno porque tá um frio de lascar e a vontade de sair pra colher os recém- floridos botões dos jardins, onde fica? No mesmo lugar onde estão o

Amar

Quem ama não sabe o que ama, nem sabe porque ama, nem o que é amar... Amar é a eterna inocência, inocência: não pensar. Por isso, cambaleio pelas ruas da vida, tropeçando em corações que não existem e, mesmo assim, sangram. Brinco de olhar para os olhos que não me enxergam e brinco de pegar pela mão um corpo que não há. Polinizo meus passos com um sorriso sincero, deixo transparecer uma alma pueril que ilumina-se na menor descoberta e encolhe-se com o medo de escuro. Não, nunca soube o que é amar e mesmo assim tento, pinto, bordo, faço choro e faço abraço. Saudade e afago. Digo coisas sentimentais e filosofias de fundo de garrafa. Amar assim, como amo, é o jeito que sei que é amar. Se não existe o certo, nem o errado no amor fico mais calmo, pois posso ser perdoado. Neste caminho de amante, parti muitos corações partidos e partiram meu coração partido, em cada despedaçar, uma pétala a menos no jardim e um novo botão a florescer. É preciso chover e fazer Sol, somente assim o solo fertil

Adelaide

Adelaide era uma moça, mas poderia muito bem ser um passarinho, tal a leveza com que andava pelas ruas, quase a flutuar levada pelas brisas amenas do ontem e do hoje. Tinha os cabelos castanhos claros e encaracolados e um rosto de pele tão alva e sedosa que poderia ser uma pintura feita por um artista do século XVIII, mas Adelaide não era pintura, nem era passarinho. Ela costumava encostar-se naquela esquina ali, onde tem a barraca de cachorro-quente agora, sentava-se naquela mureta e aguardava quem alguém lhe oferecesse serviço. Nunca soube dirigir, mas havia passeado em muito carros e gostava de todos, fossem os novos com cheiro de novos, fossem os velhos com cheiro de ferrugem. Olhava para todos os cantos dos carros, os estofados, o teto, o velocímetro. Quem conhecia um pouco mais de Adelaide dizia que não passava de uma menina e, como toda menina, tinha nos olhos a vontade incessante de descobrir. Sua beleza era simples e exata, os traços finos e os movimentos sincronizados, pa

Se eu quiser falar com Freud

Se eu quiser falar com Freud Tenho que deitar no divã, tenho que esquecer seu rosto Tenho que soltar a voz, tenho que contar segredos e saber que está contando o tempo. Se eu quiser falar com Freud, tenho que me assegurar de não esquecer meus medos, nem desejos, tudo por falar. Tenho que abrir o peito e me olhar dentro do espelho. Se eu quiser falar com Freud, tenho que saber sonhar, tenho que contar detalhes que não posso suportar, tenho que lembrar amores que eu nunca esqueci, tenho que dizer verdades, verdades que me fazem existir. Se eu quiser falar com Freud, tenho que me perdoar, tenho que ouvir seu silêncio e nele me confortar. Tenho que falar como Homem, como um filho de Deus. Tenho que fazer de tudo, pra saber quem sou eu.

Naquele dia, eu brinquei no Paraíso.

Lembro-me como se fosse hoje, era um dia de Julho, beirando Agosto, acordei cedo e num pulo. Prestei atenção aos barulhos da casa, não havia barulho. Fui ao banheiro e escovei lentamente meus dentes. Quando desci as escadas me deparei com tios e tias, meu pai e minha mãe. Todos cabisbaixos e quietos, como minha audição anterior havia percebido. Ausência também é algo que se percebe. Ainda estranhando, cumprimentei a todos, que me responderam com abraços longos e ternos, estranhei aquilo, assim como estranhei os olhos inchados que tinham todos eles. De repente, como se não pudesse ais sufocar um desejo, minha tia começou a chorar e, neste instante, minha mãe pegou-me pela mão e me levou até a cozinha. - Filho, aconteceu uma coisa. - Quem morreu? - eu não sei porque fiz aquela pergunta, nem havia pensado qualquer coisa assim, após ter deixado as palavras fugirem da boca me espantei, minha mãe também. - Você sabe que o vovô não estava muito bem... - fez uma pausa, olhou para cima e