"Contribuição" sobre os livros não contribui em nada

 




Estamos em agosto de 2020, a pandemia está por aí, colegas perdendo empregos, avaliamos a qualidade de distintas marcas de álcool gel, higienizamos as compras do mercado, estocamos papel higiênico como se fossem a solução para metade dos problemas.

Em meio a isso tudo, chega uma ideia de simplificar a carga tributária no Brasil. Como? Criando uma contribuição - pra mim é eufemismo para imposto, já que não posso optar em contribuir, sou obrigado a. Se for aprovado.
Fique claro, sou favorável a uma simplificação da carga tributária brasileira, que é tão absurda quanto a história de Macunaíma, o verdadeiro herói brasileiro. Afinal, que país taxa seu cidadão na hora em que se recebe a renda, na hora em que se adquire o bem e na hora em que se desfaz dele? Fora que entre esses pontos tem uns penduricalhos aqui e ali, cada Estado com uma alíquota, enfim. Um labirinto kafkaniano em que somos inseridos e não valemos nem uma barata.
A Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), quer unificar PIS/PASEP e Cofins. Uma sopa de letrinhas que da boca pra fora dizem servir para desonerar a folha de pagamento das empresas e, com isso, estimular o empresariado a contratar mais. Contratar mais é bom, sempre é, desde que haja realmente essa conversão. E não é novidade saber que muitas vezes o benefício não é repassado pra sociedade, morre no bolso de quem deveria compartilhar, perpetuando o travamento da roda gigante. Quem está em cima, assim fica. Quem está embaixo também.
E sabe quem mais pode sofrer com isso, além de você e eu? Os habitantes de Macondo, a madame Bovary, os anônimos que descrevo no meu livro, Lagartos ao Sol. Sabe por quê? Essa CBS entra numa brecha e faz com que os livros, que desde a Constituição de 1988 são isentos de impostos, passem a ser taxados em 12%. E a leitura, que no Brasil não é uma das grandes paixões nacionais, deve sofrer um revés ainda maior. Além disso, falando como autor, essa taxa faz que o governo arrecade mais com um livro do que o próprio autor que o escreveu, tendo em vista que no mercado editorial impresso, um autor recebe, em média, 10% de royalties pela sua obra.
Grotescamente, é como se eu fosse cobrado em 120% no Imposto de Renda, se minha única renda fosse a venda livro, o governo sempre ficaria com mais do que eu mesmo pude receber. Nem Kafka imaginaria um enredo tão irreal.
Correm pela internet abaixo-assinados para que isso não vá pra frente, não a CBS, mas a taxação de livros. E eu os convido a fazer parte dessa luta pelo direito de pessoas tornarem-se novos leitores e para que a rica história de Macondo ou de Gregor Samsa possa enveredar pelo imaginário de mais e mais pessoas através dos livros.
Pode ser que quando ler essa postagem já tenha sido tarde ou pensar que valeu a pena e conseguimos essa conquista de barrar a taxação. De qualquer forma, falar sobre artifícios para achatar a cultura no Brasil é chover no molhado, é falar do futuro olhando pelo retrovisor. Por isso digo, essa postagem já nasceu datada, mesmo assim, merece ver a luz do dia.

O perfil de Instagram, Leitura Orgânica, criou um abaixo-assinado para que o livro não seja taxado. Clique no link http://chng.it/tTybFCBM2T para fazer parte dos que são contra essa "contribuição".

E se você não sabe o que é Macondo, quem é Gregor Samsa ou os anônimos de Lagartos ao Sol, aqui embaixo você pode encontrar suas histórias (espero que sem o acréscimo de 12%).




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