Réquiem
Eles estavam na terra, eles estavam no ar. O que traziam consigo em suas mentes nunca será descoberto, o que faziam naquele momento pouco importa agora. Alguns deviam estar trabalhando, outros a descansar. Preparando-se para o fim do dia, para o fim da viagem. Nunca para o fim da vida.
A tragédia que invadiu a casa de milhões de pessoas ao redor do mundo, através das notícias televisivas, consternou, enfureceu, entristeceu. Via-se pela televisão o empenho do Corpo de Bombeiros para acabar com os focos de incêndio que consumiam o prédio invadido pelo avião da TAM, via-se o choro de quem não sabia se seu parente estava ao não à bordo do avião, as notícias chegavam amiúde e controversas, quem deveria tomar partido e falar, calou-se. Silêncio que asfixiava as esperanças de quem só podia ter esperança.
Pouco a pouco, a dimensão da tragédia tornava-se cada vez maior, assim como a indignação de quem sofria na pele, no coração, na alma e via nas imagens daquele prédio em chamas o fim da vida de um ente amado. Veio então o grito, o choro, o desespero confirmado quando, lentamente, a lista de passageiros e vítimas ia sendo informada. Vidas cessadas, sonhos abortados, futuros decepados, incinerados.
Agora, procura-se o motivo, a desculpa, o bode-expiatório. Neste país repleto de impunidade se dá tanto valor para saber quem fez, de quem é a culpa... pra quê? Descobrir o que de fato ocorreu não minimizará a dor de quem perdeu uma pessoa amada naquele dia, mas é preciso descobrir pra que não mais isso ocorra e não sejamos nós a chorar lágrimas de sangue no futuro.
Que não seja necessário outro desastre para que sejam tomadas decisões e providências para minimar a possibilidade de algo parecido tornar a acontecer. Que esta mazela aérea se resolva e que as pessoas encarregadas e responsáveis sejam capazes de desempenhar a função a que foram destinados.
Este é um texto demagógico sim, assim como todos os textos escritos sobre o que ocorreu. Deve-se pensar, então, se estamos sendo tão óbvios em nossos pensamentos, é porque só nos restou a demagogia de cobrar justiça. Isso é triste.
Eu, que moro a poucos quilômetros do aeroporto de Congonhas, senti naquele dia o cheiro de queimado invadir minha casa. Não o cheiro de queimado do combustível, do prédio, do avião. Naquele dia, tive o desprazer de sentir o cheiro de futuros sendo queimados vivos.
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