Quase-morte
Há um tempo atrás, meses, tive uma experiência que espero ser única. A quase-morte. Não sei se digo agora quase-morte ou não-morte, afinal, estou vivo. O "quase" se tornou mera conveniência.
A verdade é que quando isto aconteceu eu não estava presente pra saber o quão ruim esta experiência é, fiquei de expectador da minha própria vida e minha vida estava inteiramente na mão de outras pessoas, como se estivesse num carro desgovernado, nada que se faça no volante mudará o trajeto que o carro desenhará. Nem dor senti, só depois. Antes de uma quase-morte, o que vivi pareceu a mim mais uma longa noite de sono que durou quase uma semana.
Depois de acordado é que as coisas começaram a existir e tudo muito confuso, mas não estranho. Engraçado isso, ainda não sei expressar muito bem a coleção de sentimentos que tive quando acordei naquela UTI com uma perna engessada, a outra com uns pinos atravessando minha canela, sem poder mexê-las. Talvez demore anos de terapia para que eu possa assimilar tudo aquilo, como se isso fosse importante.
Desta quase-morte, quem mais sofreu foi quem viu o que estava acontecendo e tinha, todos os dias, no coração, a incerteza de me encontrar com vida. Não sei se a fé remove montanhas, mas salva vidas.
Agora que a poeira está baixando é que vejo que numa situação como esta, mesmo sobrevivendo a gente morre. É uma morte sem enterro, sem velório, é uma morte silenciosa que se faz presente apenas dentro de quem sobreviveu. É preciso ser assim. Não sei se por algum tipo de sinal ou coisa do gênero, quando algo assim ocorre é porque era preciso aquela pessoa morrer de um jeito pra deixar outra nascer. Sendo assim, neste mês de junho, entro no nono mês de gravidez de mim mesmo. A forma que renascerei é um esboço muito bonito do que tenho de melhor em mim que só se concretizará com o passar do tempo, engatinhando, andando, aprendendo a falar...a amar.
Tudo, tudo de novo. Com o peso não ser mais iniciante e não ter direito de errar.
O que tenho certeza agora é que é melhor a quase-morte que tive que a quase-vida que estava sendo. O sofrimento é maior quando quase se vive do que quando quase se morre. Nesta, a esperança e o sentimento de transformação guiam os pensamentos para ações positivas. Naquela, há apenas um beco acinzentado e um céu nublado de quem se sente deslocado de tudo o que acontece à sua volta e reserva nos outros a esperança de alguma mudança boa em sua vida.
Comentários
As vezes penso que a morte deve ser assim, este sono profundo, as vezes não, sei lá, ninguém sabe.
Certamente são os que ficam que sofrem querido. O buraco que a pessoa que se vai deixa é tão grande, que não se explica em palavras. Fica apenas a certeza que jamais seremos tão felizes novamente. O nosso egoísmo de termos as pessoas amadas ao nosso lado é muito grande, por isso tanto sofrimento.
Bj